Todos as manhãs o caos das idéias que surgem no nascimento de um novo dia lhe inundavam a mente. Como sempre estava confusa. Entretanto Flávia sabia que novamente devia silenciar sua mente. Uma mente calada não sofre. Sua rotina estava pronta: Acordar, comer, estudar, trabalhar ver o Paulo e voltar pra casa. O único ponto de alívio era o Scott uma vira-lata que tinha adotado mês passado.
Faltavam seis meses para que sua vida acabasse e começasse uma nova vida, afinal a vida é um conjuntos de vidas, ou semi-vidas como queiram.
Estar viva já era uma dor avassaladora, mas que ela só sentia ao despertar. Ontem depois que viu Paulo e no caminho para casa desejou inutilmente ser outra pessoa. Talvés amanhã ao invés de tomar café tomasse chá, isso seria o começo. Paulo estudava medicina e eles namoravam há 2 anos, mas silenciosamente Flávia sabia que estavam juntos apenas porque quem eles queriam não os quiseram e a dor os uniu, afinal sofrimento partilhado é sempre mais leve.
O chá estava um pouco amargo. A sua boca amargava, ela detestava essa situação. Correu para o banheiro. Iria se atrasar como todos os dias. Em frente ao espelho não se reconheceu, o espelho sempre a maltratava. Eu não sou essa pessoa com olhos de peixe morto. Quem sou eu? Decidiu que no fim do dia iria ligar para a mãe e pedir um novo espelho aquele estava com defeito.
Enfim pegou a bolsa e saiu apressada, ao se lembrar de Tomás , lembrou-se também de passar batom. Eles estavam envolvidos num flerte. Tomás estudava Administração assim como Flávia, eles tinham namorados, mas só se lembravam deles depois do trabalho. A Rotina era sempre igual.
No intervalo risos, conversas inúteis. Vocês já viram o novo clipe da Lady Gaga? Ela sim sabe tratar os homens. Todos riem novamente. Quem sou eu? - A pergunta ecoa na cabeça de Flávia e lhe causa um leve enjôou. Pensar nela adoecia. Ela era doente.
Saiu um pouco e foi sentar-se num banco , respirar próximo aos outros era tão difícil. As vezes achava que os olhos dos desconhecidos lhe acusavam de roubar o oxigênio, ela era culpada por tentar existir, que ousadia! Um Rapaz passou. O Rapaz que sempre olhava para ela quando sentava naquele banco. Eles nunca conversaram, talvés falta de assunto. Ela não sabia ao certo. Eles tinham medo de se aproximar e passaram dias naquela dança frenética, parecendo dois animais vadios, que se atraiam e causavam repulsa ao mesmo tempo.
Tudo isso não passava do intervalo. Porque ele me olha tanto? O olhar é diferente, um olhar desarmado. Ela também tem medo. Porque não chega perto? Porque eu não chego perto?
E O Chá? O Chá era amargo, mas estava decidida a mudar apesar das amarguras. As vezes é necessário beber chá. Sentiu de leve o amargor do chá na boca e o enjôou da existência cessou. O Chá tinha lhe mudado, deu-lhe força de alguma forma que lhe permitisse apenas ser. Flávia levantou-se e caminhou em direção ao rapaz, os olhos dele estavam inquietos . Ele não entendia. Ela sim. Aproximou-se, respirou fundo e perguntou:
_ Quem é você?
E Ele respondeu apenas com um sorriso.